Conteúdo do impresso Edição 1275

FURTO DE ENERGIA

Prefeito de Rio Largo recorre ao STJ para escapar de condenação

Imóvel flagrado sem contador rendeu à esposa de GG sentença de 2 anos de prisão
Por VERA ALVES 20/07/2024 - 06:00

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Reprodução/instagram
Cristina e o marido GG tiveram imóveis flagrados com ‘gato’ de energia
Cristina e o marido GG tiveram imóveis flagrados com ‘gato’ de energia

Seis dias antes de a primeira dama de Rio Largo, Maria Cristina Cordeiro da Silva, ser condenada a 2 anos de prisão por furto de energia, o prefeito Gilberto Gonçalves entrou com ação no Superior Tribunal de Justiça (STJ) na tentativa de evitar receber a mesma sentença. A condenação de Cristina Gonçalves, como é conhecida a também vice-prefeita, foi prolatada a 20 de junho último pela juíza Eliana Augusta Acioly Machado de Oliveira, da 3ª Vara Criminal de Rio Largo, enquanto o marido entrou com pedido de habeas corpus junto ao STJ no dia 14 de junho.

O detalhe é que o HC é o mesmo impetrado por GG no Tribunal de Justiça de Alagoas e rejeitado pela Câmara Criminal em outubro do ano passado. Nele, o prefeito tenta se eximir da acusação de furto de energia, crime previsto no artigo 155 do Código Penal (Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel) e cujo parágrafo terceiro afirma: Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.

O caso envolvendo o casal remonta a 22 de novembro de 2016, quando uma força-tarefa da então Eletrobras Alagoas flagrou a ausência de medidores de energia elétrica em dois imóveis de propriedade de GG e esposa, ambos situados na Avenida Fernando Collor de Mello, a principal via de Rio Largo. Para ter acesso a um dos imóveis, os funcionários a serviço da companhia de energia precisaram acionar a Polícia Militar, segundo consta do inquérito enviado à Justiça, porque o caseiro se negou a permitir que a equipe entrasse argumentando que se tratava da casa do prefeito Gilberto Gonçalves.

A ausência de medidor de energia nos imóveis foi confirmada pelos funcionários, segundo os quais as respectivas caixas de energia estavam vazias, sem o contador, havendo uma ligação direta da rede de distribuição para o imóvel, o popular ‘gato’. Uma irregularidade que já havia sido flagrada em abril de 2010 nos mesmos imóveis, o que levou a concessionária a reinstalar os medidores. Porém, ao longo dos anos, foram necessárias outras substituições porque ou o medidor simplesmente desaparecia ou era encontrado carbonizado.

De acordo com os autos da ação penal em que Cristina Gonçalves foi condenada, o ‘gato’ encontrado em 2016 no imóvel de registro 0157497-3 provocou um prejuízo de mais de R$ 90 mil à concessionária, mas o casal conseguiu se desvencilhar do débito graças a uma ação declaratória de inexistência de débito impetrada em 2018 pela vice-prefeita e acatada pela juíza Marcli Guimarães, então titular da 1ª Vara de Rio Largo/Cível e da Infância e Juventude em decisão de 13 de janeiro de 2022.

A ação visava impedir que a concessionária suspendesse o fornecimento de energia do imóvel até que fosse efetuado o pagamento do débito de R$ 90.793,64 apurado dentro do processo administrativo instaurado pela empresa após o flagrante de 2016. A Equatorial – que assumiu o controle da distribuição de energia elétrica em Alagoas em março de 2019 – recorreu da decisão da juíza que foi mantida pela 3ª Câmara Cível do TJAL em julgamento realizado em outubro de 2022 por entender que a concessionária não provou ter havido consumo irregular de energia durante o tempo em que o imóvel esteve sem medidor.

“Não restando caracterizada a existência de débito, não há que falar em forma de cálculo de recuperação de consumo e em custo administrativo. Incabíveis, ainda, a inscrição do consumidor em órgão de proteção ao crédito, bem como a suspensão do fornecimento do serviço”, acrescentou o relator, desembargador Domingos de Oliveira, cujo parecer foi acatado pelos demais integrantes do colegiado. 

Prisão de vice-prefeita é convertida em ajuda pecuniária

GG e a esposa conseguiram não pagar, até agora, pela energia que usufruíram a seu bel-prazer, mas não conseguiram escapar da responsabilização penal pelo furto de energia, crime comprovado por testemunhos e fotos da operação realizada em 2016 e corroborada por testemunhos dos funcionários terceirizados a serviço da concessionária, pelos dos policiais militares que atenderam a ocorrência naquele 22 de novembro e até pela atendente da Central da PM que atendeu a ligação dos funcionários pedindo segurança.

Ré primária, a vice-prefeita Cristina Gonçalves teve a pena de prisão de 2 anos e 1 mês substituída por duas penas restritivas de direito, ambas de prestação pecuniária no valor de 10 salários mínimos cada (total de R$ 28.240) em favor de duas diferentes instituições. A ela também foi imposta multa de 141 dias-multa no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente na época do crime. Em 2016, o salário mínimo vigente no país era no valor de R$ 880, o que significa que a multa a ser paga por Cristina Gonçalves gira em torno de R$ 4.135,53.

RECURSOS REPETITIVOS MOSTRAM DESESPERO DO PREFEITO

Desde o ano passado, o prefeito Gilberto Gonçalves trava uma verdadeira guerra contra o tempo na tentativa de evitar a qualquer custo a condenação à prisão pela 3ª Vara Criminal de Rio Largo. É nela que tramita a ação penal 0701550-38.2019.8.02.0051 em que ele figura como réu pelo furto de energia elétrica flagrado pela operação da Eletrobras Alagoas no imóvel de matrícula 822.033-6 e cujo andamento vem sendo frequentemente suspenso graças às manobras protelatórias de GG.

À época, a concessionária calculou em R$ 93.597,16 o valor devido pelo prefeito de Rio Largo por conta do ‘gato’, de acordo com a denúncia que gerou a ação penal, que teve a tramitação suspensa graças a liminar concedida pelo desembargador Washington Luiz Damasceno Freitas a 26 de julho do ano passado, um mês antes de ser aposentado compulsoriamente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) como punição por condutas inadequadas no exercício da magistratura.

A liminar foi concedida por Washington Luiz no bojo do Habeas Corpus Criminal 0806010-93.2023.8.02.0000 impetrado pela defesa do prefeito, mas o julgamento do mérito pela Câmara Criminal em outubro do ano passado rejeitou o pedido de anulação da ação penal, como requeria GG sob o argumento de que não havia provas do crime.

O prefeito ingressou desde então com outros habeas corpus criminais com diferentes argumentos, um deles invocando o direito ao foro privilegiado como chefe do Executivo Municipal, todos rejeitados pela Câmara Criminal. Em mais uma tentativa de escapar da condenação, ajuizou um mandado de segurança no dia 18 de junho último e obteve, um dia depois, liminar favorável do desembargador Ivan Vasconcelos Brito, suspendendo mais uma vez a ação penal – que já está em fase de prolação da sentença – até o julgamento do mérito do HC 0800172-95.2024.8.02.9002 iniciado na última quarta-feira, 17, mas suspenso por pedido de vistas do desembargador Celyrio Adamastor.

Com os sucessivos fracassos perante a Justiça estadual, que não tem acatado seus argumentos de foro privilegiado uma vez que o furto de energia se trata de crime comum não relacionado ao cargo, GG recorreu então ao Superior Tribunal de Justiça com novo habeas corpus (921890/AL) que está sob a relatoria do ministro Ribeiro Dantas. O prefeito sofreu a primeira derrota no STJ ao ter negado seu pedido de liminar pelo ministro que pediu informações do processo original à 3ª Vara Criminal de Rio Largo, informações estas enviadas a Ribeiro Dantas na última terça-feira, 16, pela juíza Anna Celina de Oliveira Nunes Assis.



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